Notas sobre futebol – o debacle Português no Brasil

Como todos os que viram o jogo da selecção Portuguesa contra a Alemanha, também tenho uma opinião que mais do que analítica é intuitiva. Certamente alguns concordarão com alguns dos meus pontos, alguns certamente discordarão. Ainda bem! AINDA (mesmo que alguns não gostem) é possível discordar neste país.

  • Mais uma vez vi o Nani a estragar jogadas feitas para outros colegas. Não é a primeira vez que isto acontece na selecção onde até estragar golos feitos o Nani consegue. Não se vê tal coisa noutras seleções, nem naquelas muitos lugares abaixo de Portugal no Ranking, nem naquelas onde tradicionalmente o rigor tático não é a principal arma.
  • Culpar o Ronaldo por um jogo não conseguido em que foi todo ele passado longe da sua área de influência é ser obtuso. Sim, o CR esteve abaixo do normal, mas a Alemanha jogou basicamente na nossa ala direita e em cima do nosso meio campo e defesa, deixando o CR fora do jogo. Quando isso acontece e a selecção não consegue ter a bola o tempo suficiente para alimentar a ala esquerda o Ronaldo não aparece. Mas para alguns o CR até tinha que aparar as fífias do Patrício.
  • A atitude tática desta selecção é de espantar. Aquilo que temos visto neste mundial são equipas a entrar me 5-3-2, para garantir estabilidade no primeiro jogo. A Argentina entrou num 5-3-3 para ter solidez defensiva primeiro e mudou para a sua formação tradicional na 2a parte para impor o seu futebol. Nós entramos com uma atitude de quem não precisa ter cautelas, que ganhar à Alemanha eram favas contadas e saiu-nos a fava.
  • O descontrolo emocional mostra que a preparação psicológica não foi feita para lidar com a adversidade. A culpa deste comportamento é da equipa técnica. Quando o Ricardo Quaresma ficou de fora do mundial com o argumento que era um indisciplinado batiam-se palmas no burgo.
  • Lesões. Todas as selecções estão sujeitas a azares, mas dois rasgões musculares, uma selecção que parecia exausta fisicamente, e sabendo que fomos a última selecção a aterrar no Brasil (e portanto deixando os nossos jogadores com menos tempo de adaptação) levam-me a pensar no planeamento que foi feito, e nas responsabilidades que vão morrer orfãs neste capítulo.
  • Mais uma vez se prova que desde o tempo do Rui Costa primeiro, e do Deco que o substitui, que a selecção não tem o patrão do meio campo que imponha o ritmo e o controlo necessário. Moutinho, Meireles ou Veloso, nenhum deles faz esse papel com a classe necessária. Servem contra equipas medíocres, mas contra grandes equipas como a Alemanha, anulam-nos o meio campo e deixam o CR7 perdido num canto do campo sem ninguém para fazer a ligação.
  • Olhando para a cobertura que as televisões portuguesas estão a fazer da selecção, com acesso aos bastidores, ao que comem, ao que cag…, parece-me que são em parte responsáveis por um clima de euforia Sebastiónica que não ajuda em nada a selecção. Que as TVs façam este tipo de cobertura propagandista não surpreende. O que surpreende é que os responsáveis da federação abram portas do grupo de trabalho e participem deste convívio festivo.
  • O modelo de jogo. Alguém me sabe dizer qual é o modelo de jogo Português? Aquilo que vi foi uma selecção sem automatismos, sempre a ter que parar a bola para tentar perceber o que os colegas iam fazer a seguir. Sempre com passes que criam dificuldades para a recepção dos colegas, sem fluidez ou propósito. Há muitas formas de jogar futebol, do tiki-taka do Barcelona, ao jogo cínico italiano, o bloco físico do Atlético de Madrid, ou do jogo directo e de correria Inglesa. Aquilo que nós não temos é uma forma de jogar. Aliás, ao longo da classificação percebia-se isso, que os resultados iam aparecendo (quando apareciam) mais fruto de uma persistência estóica do que propriamente de um plano de jogo em equipa.
  • A selecção precisa de um reformulação séria, mas não ao nível de jogadores, porque tirando um caso ou outro, estes são os melhores que temos. O que a selecção precisa de mudar é ao nível técnico, de ter alguém capaz de impor ideias inteligentes e modernas em termos daquilo que a selecção deve ser. Tem que ter uma filosofia de jogo que permita alimentar as nossas melhores armas de forma consistente e suster sistematicamente os ataques adversários. Se é num 4-4-2, 4-3-3 ou 6-4-0, se é tiki-taka, chuta p’rá frente, ou ‘corre Ronaldo’ isso não interessa. O que interessa é que o modelo adoptado tem que ser respeitado e implementado. O que se viu neste jogo foi uma selecção que não sabia muito bem o que implementar em campo. Várias vezes se viu a selecção chegar perto da área Alemã e não saber se iria jogar pelas laterais para um cruzamento, se ia procurar o Ronaldo, ou se rematava de fora… pareciam perdidos sem um plano. E isso é o pior que se pode fazer: Uma selecção sem um plano é presa fácil até para equipas mais fracas.
  • A selecção está atordoada e vai ter ainda dois jogos muito difíceis, nomeadamente contra os EUA, que não sendo virtuosos do futebol, tem exactamente um plano, no qual acreditam e que vão tentar impor. Nas suas dificuldades sabem que a disciplina e o jogo de equipa são o seu forte. A nossa maior dificuldade vai ser exactamente construir um modelo de jogo em que todos acreditem e tentem implementar. Custa ver que esta seleção não tenha um ideia de como jogar em equipa, parecendo muitas vezes um circo onde o objectivo é ir passando a bola para a as agilidades do próximo artista até um eventual golo final.